Disseram-me que a Maria José de Brito fechou. Quem não é de Moura estará nesta altura a perguntar "Quem?".
A D. Maria José de Brito é uma senhora sem idade que tem uma loja. Não é bem uma loja, é um armazém. Talvez não seja bem um armazém, mas um depósito de tudo o que já foi alguma vez comercializado neste país desde que a menina Maria José decidiu ter "uma porta aberta".
Ainda me lembro da outra loja, pequena e completamente atafulhada de mercadoria. Lembro-me do alívio da clientela quando se espalhou a notícia das novas instalações, uma espaço amplo de uma antiga oficina, reconvertido agora em armazém.
A entrada da loja é um portão de ferro, de onde se vislumbra um caminho com a largura suficiente para uma pessoa passar, aberto por entre artigos em verga e outros objectos de maior dimensão. Ficam ali à saída porque não são muito fáceis de roubar, a sua dimensão protege-os do amigo do alheio. Mais à frente o caminho desemboca numa clareira, um espaço com 4 a 5 metros quadrados onde as clientes aguardam pacientemente a sua vez de se encostarem ao balcão e pedirem enfim, aquilo que as trouxe até ali. E isso pode ser qualquer coisa: calças e camisolas, casacos, camisas, pijamas, fatos de treino, meias, roupa interior, camisolas de aquecimento, roupa para trabalhos mais pesados, botas, lençóis, cobertores e edredons, colchas, toalhas de banho, toalhas de mesa e também louças, talheres e copos. Há jogos e brinquedos, cortinas de duche, pantufas, chinelos, fatos de banho, bibes para o jardim-de-infância, instrumentos e pequenos equipamentos de cozinha, baús, mesas e cadeiras. Só não há comida.
Do ponto de vista do cliente, o amontoado é indescritível e parece impossível encontrar seja o que for ali. Mas enganam-se. Tudo tem uma ordem meticulosa, uma organização lógica que visa o aproveitamento máximo do espaço e a entrada constante de novas mercadorias sem que nada do que lá está se deite fora.
Já lá comprei muita coisa: Cobertores para a cama dos meus filhos, muitos pijamas e camisolas interiores que os mantiveram quentinhos em muitos Invernos, meias e fatos de treino que levavam para a escola, sem medo dos efeitos das brincadeiras. Afinal era tudo muito mais barato do que em qualquer outro sítio e os miúdos andavam à vontade. Foi lá que comprei os bibes que vestiram nos primeiros dias de escola e muitos lençóis para todas as camas.
Nunca tive o hábito de comprar lá roupa. Não por vergonha ou qualquer outro tipo de preconceito, mas porque comprar lá seja o que for, só é possível mediante duas estratégias: Saber muito bem o que se quer, pedir e esperar pacientemente que a menina Maria José surja de um dos minúsculos corredores que ficam por trás do balcão com o que pretendemos na mão, ou assistir às compras da cliente que está à nossa frente, descobrir que afinal, a menina Maria José também vende daquilo e pedir igual quando chegar a nossa vez.
Dizem as más-línguas cá do burgo que há por aí muitas senhoras com ar de finas que afinal só vestem na boutique MJB... Eu cá acho que elas fazem bem, só invejo a perspicácia que lhes permite vislumbrar o que trazem vestido no meio da loja.
E agora isto... Uma notícia que é um terramoto na vida quotidiana da minha terra. A Maria José de Brito, essa catedral de consumo onde todos podiam comprar, fechou as portas. Foi vítima das regras idiotas de facturação e das registadoras supersónicas que o governo impôs. Para quê, se a menina Maria José fazia a conta à nossa frente, em bocados de embalagens que cortava à medida para o efeito? E para todos termos a certeza de não haver engano, até fazia a prova dos nove!