segunda-feira, 22 de março de 2010

Feira do Livro de Moura: 30 anos | 1993

1993

Em 1993 a Feira do Livro decorreu de 19 a 26 de Junho, coincidindo com as comemorações do Feriado Municipal. A notícia da feira, publicada no Jornal de Moura, não dá indicações sobre a existência de um programa cultural específico.


Portugal vê nascer mais uma estação privada de televisão (TVI) e assiste à inauguração do polémico Centro cultural de Belém.

O Tratado de Maastricht entra em vigor e a CEE dá lugar à União Europeia (EU). Em Dezembro, consegue-se ultimar o Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio (GAT). É também em Dezembro que se realizam eleições autárquicas no nosso país e Manuel António Vitorino Mestre é eleito presidente da Câmara Municipal de Moura.

É um ano triste para a literatura nacional: Morre o escritor alentejano Manuel da Fonseca a 11 de Março e apenas cinco dias depois, o país perde a voz de Natália Correia. A nível internacional, o Nobel da Literatura é atribuído à norte-americana Toni Morrison ''pelas novelas, caracterizadas de grande força visionária e que ilustram um aspecto essencial da sociedade norte-americana".
 
O que parecia impensável e impossível apenas há alguns anos acaba por suceder em 1993: Nelson Mandela e Frederik De Klerk partilham o Prémio Nobel da Paz, ''pelo seu esforço conjunto para acabar de forma pacífica com o apartheid". Em Washington, Israel e Palestina assinam um acordo de paz apadrinhado por Bill Clinton.
 
Na cerimónia dos Oscars deste ano, o vencedor é Unforgiven, de Clint Eastwood, com 4 estatuetas, logo seguido de Howard's End e Bram Stoker’s Dracula, com 3 Oscars cada um.
 
Na música, deixem-me salientar esta versão dos UB40 de  Can’t Help Falling In Love, que atingiu o 3º lugar na tabela dos mais vendidos de 1993.

2 comentários:

  1. Dedicado: ao Dia Mundial da Poesia; a Manuel da Fonseca; a Mário Viegas; aos que lutaram e continuam a lutar contra a civilização capitalista que inventou o domingo, num tempo em que as palavras “modernidade”, “competitividade”, “flexibilidade”, “desenvolvimento”, “contenção”, “crise”… continuam a justificar os maiores abusos em relação aos elos mais fracos da sociedade.
    Há mais mendigos nas ruas. Há mais casas de penhores. Há mais Mariazinhas Santos. Há cada vez mais pintores a saber ciências raras…

    “Quando chega domingo,
    faço tenção de todas as coisas mais belas
    que um homem pode fazer na vida.
    Há quem vá para o pé das águas
    deitar-se na areia e não pensar…
    E há os que vão para o campo
    cheios de grandes sentimentos bucólicos
    porque leram, de véspera, no boletim do jornal:
    «Bom tempo para amanhã»…
    Mas uma maioria sai para as ruas pedindo,
    pois nesse dia
    aqueles que passeiam com a mulher e os filhos
    são mais generosos.
    Um rapaz que era pintor
    não disse nada a ninguém
    e escolheu o domingo para se matar.
    Ainda hoje a família e os amigos
    andam pensando porque seria.
    Só não relacionam que se matou num domingo!
    Mariazinha Santos
    (aquela que um dia se quis entregar,
    que era o que a família desejava,
    para que o seu futuro ficasse resolvido),
    Mariazinha Santos
    quando chega domingo,
    vai com uma amiga para o cinema.
    Deixa que lhe apalpem as coxas
    e abafa os suspiros mordendo um lencinho que sua mãe lhe bordou,
    quando ela era ainda muito menina…
    Para eu contar isto
    é que conheço todas as horas que fazem um dia de domingo!
    À hora negra das noites frias e longas
    sei duma hora numa escada
    onde uma velha põe sua neta
    e vem sorrir aos homens que passam!
    E a costureirinha mais honesta que eu namorei
    vendeu a virgindade num domingo
    — porque é o dia em que estão fechadas as casas de penhores!
    Há mais amargura nisto
    que em toda a História das Guerras.
    Partindo deste principio,
    que os economistas desconhecem ou fingem desconhecer,
    eu podia destruir esta civilização capitalista, que inventou o domingo.
    E esta era uma das coisas mais belas
    que um homem podia fazer na vida!
    Então,
    todas as raparigas amariam no tempo próprio
    e tudo seria natural
    sem mendigos nas ruas nem casas de penhores…

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  2. Penso isto, e vou a grandes passadas…
    E um domingo parei numa praça
    e pus-me a gritar o que sentia.
    mas todos acharam estranhos os meus modos
    e estranha a minha voz…
    Mariazinha Santos foi para o cinema
    e outras menearam as ancas
    — ao sol como num ritual consagrado a um deus! —
    até chegar o homem bem-amado entre todos
    com uma nota de cem na mão estendida…
    Venha a miséria maior que todas
    secar o último restolho de moral que em mim resta;
    e eu fique rude como o deserto
    e agreste como o recorte das altas serras;
    venha a ânsia do peito para os braços!
    E vou a grandes passadas
    como um louco maior que a sua loucura…
    O rapaz que era pintor
    aconchegou-se sobre a linha férrea
    para que a morte o desfigurasse
    e o seu corpo anónimo fosse uma bandeira trágica
    de revolta contra o mundo.
    Mas como o rosto lhe estava intacto
    vai a família ao necrotério e ficou aterrada!
    Conheci-o numa noite de bebedeira
    e acho tudo aquilo natural.
    A costureirinha que eu namorei
    deixava-se ir para as ruas escuras
    sem nenhum receio.
    Uma vez que chovia até entrámos numa escada.
    Somente sequer um beijo trocámos…
    E isto porque no momento próprio
    olhava para mim com um propósito tão sereno
    que eu, que dela só desejava o corpo bem feito
    me punha a observar o outro aspecto do seu rosto,
    que era aquela serenidade
    de pessoa que tem a vida cheia e inteira.
    No entanto, ela nunca pôs obstáculo
    que nesse instante as minhas mãos segurassem as suas.
    Hoje encontramo-nos aí pelos cafés…
    (ela está sempre com sujeitos decentes)
    e quando nos fitamos nos olhos.
    bem lá no fundo dos olhos,
    eu que sou homem nascido
    para fazer as coisas mais heróicas da vida
    viro a cabeça para o lado e digo:
    — rapaz, traz-me um café…
    O meu amigo, que era pintor,
    contou-me numa noite de bebedeira:
    — Olha, quando chega domingo,
    não há nada melhor que ir para o futebol…
    E como os olhos se me enevoassem de água,
    continuou com uma voz
    que deve ser igual à que se ouve nos sonhos:
    — …. no entanto, conheço um homem
    que ia para a beira do rio
    e passava um dia inteirinho de domingo
    segurando uma cana donde caia um fio para a água…
    … um dia pescou um peixe,
    e nunca mais lá voltou…
    O pior é pensar:
    que hei-de fazer hoje, que toda a gente anda alegre
    como se fosse uma festa?…
    O rapaz que era pintor sabia uma ciência rara,
    tão rara e certa e maravilhosa
    que deslumbrado se matou.
    Pago o café e saio a grandes passadas.
    Hoje e depois e todos os dias que vierem,
    amo a vida mais e mais
    que aqueles que sabem que vão morrer amanhã!
    Mariazinha Santos,
    que vá para o cinema morder o lencinho que sua mãe lhe bordou…
    E os senhores serenos, acompanhados da mulher e dos filhos,
    que parem ao sol
    e joguem um tostão na mão dos pedintes…
    E a menina das horas longas e frias
    continue pela mão de sua avó…
    E tu, que só andas com cavalheiros decentes,
    ó costureirinha honesta que eu namorei um dia,
    fita-me bem no fundo dos olhos,
    fita-me bem no fundo dos olhos!
    Então,
    virá a miséria maior que todas
    secar o último restolho de moral que em mim resta;
    e eu ficarei rude como o deserto
    e agreste como o recorte das altas serras:
    e virá a ânsia do peito para os braços!
    Domingo que vem,
    eu vou fazer as coisas mais belas
    que um homem pode fazer na vida!”

    (Domingo, Manuel da Fonseca)

    http://www.youtube.com/watch?v=FC8uJl1cLv4

    P.A.

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